Nuno Morais Sarmento afirma, em entrevista ao Diário Económico, que o Presidente da República é “um homem sério” mas que também será responsabilizado pelo “desgoverno”.
Nuno Morais Sarmento diz que José Sócrates está em fim de ciclo e que será o seu "carácter" que o afastará do cargo de primeiro-ministro porque "não tem pára-choques" e os ministros "esfumaram-se". O ex-ministro da Presidência social-democrata diz que o PSD não pode assinar o primeiro Orçamento da crise (o de 2011), porque corre o risco de ser responsabilizado por ela e que Cavaco é lido pelos portugueses como cúmplice da reacção socialista à crise económica: "Cada vez que o Presidente da República fala sentimos um mau hálito político do lado de cá da televisão".
Disse há poucos dias que o Governo está em fim de ciclo. Em que sinais sustenta a sua tese?
Não tenho nenhuma ciência, faço apenas leitura política com base na memória histórica. Tivemos ciclos políticos completos (com Cavaco e Guterres) e, olhando para esses ciclos, encontramos um facto: a condição de derrota é a condição de vitória de quem se segue no poder. A autoridade e competência marcaram a governação de Cavaco, mas deram lugar, no final do ciclo, a autoritarismo e prepotência. Com Guterres, as condições de vitória foram o diálogo e o coração que deram lugar ao pântano.
E com José Sócrates?
Temos um ciclo atípico porque não há uma condição positiva de vitória - chega ao poder porque se criou a ideia de que Santana Lopes era parte do problema e não da solução. A impressão digital de Sócrates surgiu mais à frente e foi um poder na primeira pessoa. Não é o PS ou o Governo que assumem o protagonismo é Sócrates que exerce o poder de forma tensa e musculada.
Qual é a condição de derrota de Sócrates?
Não sei que facto provocará o fim de Sócrates ou quando isso acontecerá, mas será uma derrota pessoal em que se apreciará, pela primeira vez na História, não o desempenho do primeiro-ministro mas o seu carácter. Sócrates, ao exercer o poder de uma forma musculada, não calou os seus críticos desde a primeira hora (como eu ou Pacheco Pereira) silenciou apenas os que, por falta de coragem, não foram capazes de dizer o que pensavam. Agora, em fim de ciclo, até os pouco frontais assumem-se críticos do Governo. José Sócrates, nesta fase final, tem de temer estas críticas.
Este ciclo chegará ao fim antes ou depois das presidenciais?
Pouco importa. Importante é que o PS e José Sócrates sejam os autores do primeiro Orçamento da crise. Já vimos que o Orçamento de 2010 não assume a crise e o desgoverno socialista, esperemos que isso seja feito no OE para 2011. Se isto não acontecer repete-se o que aconteceu com Guterres e Barroso em que foi o PSD que corrigiu o desgoverno das contas públicas.
A última sondagem publicada pelo Diário Económico e TSF aponta para uma queda de popularidade do primeiro-ministro (menos 11 pontos percentuais) e do Presidente (menos cinco pontos). Estão, os dois, a ser responsabilizados pela crise económica e política?
A sondagem reflecte o que disse. Sócrates, como governa na primeira pessoa, não tem pára-choques. Recorda-se de alguma intervenção dos ministros da Ciência, da Saúde ou da Educação que sejam relevantes? Parece que os ministros se esfumaram... Quando assim é, não há pára-choques e todo o impacto cai sobre o primeiro-ministro. Se, no início, o crédito foi de José Sócrates, agora a factura também será paga por ele. É o que reflecte a sondagem.
O problema da queda de popularidade do Presidente tem que ver com o caso Face Oculta?
Creio que não. Cavaco Silva optou por ter uma postura cooperante com o Governo nos três momentos-chave da crise. Em Outubro de 2008 quando o mundo já reagia aos efeitos da crise e o Governo andava entretido a distribuir computadores Magalhães; em Outubro de 2009, quando o Governo garantia que o défice não passaria de 5% ou 6%; e, por fim, na saída da crise, quando o Governo não falou verdade. Em todos estes momentos Cavaco manteve-se em silêncio.
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